Protecionismo x Globalização
- Roberto Rocha
- Mar 20, 2018
- 3 min read
A Velha Ordem Mundial ressurge, mas enfrenta seu Cérbero.

A grande crise econômica de 2007-2008 trouxe reflexos a longo prazo para o viés do pensamento político no mundo, como ocorre em todos os episódios econômicos cíclicos, fazendo o mundo inverter a rota e adotar a cartilha nacionalista-conservadora da velha ordem mundial em detrimento das décadas de liberalismo-globalismo.
Na Europa, países enfrentam o crescimento vertiginoso da representação da direita nos parlamentos, o Reino Unido abandonou o Euro no movimento que se denominou brexit , a Áustria tem seu primeiro governo ultra-nacionalista em décadas, Ângela Merkel, o pilar do Euro, enfrenta dificuldades para formar o gabinete alemão, a Russia aprofunda o espírito nacionalista com a reeleição de Putin, com mais de 70% dos votos, tornando-se o líder russo a mais tempo no poder desde Stalin. Na China, preocupados em manter-se fortes para enfrentar o que está por vir, Xi Jinping ganha mandato ilimitado para governar. E os EUA elegeram um conservador nacionalista que promete defender o way of life americano whatever the cost.
Mas, porque as pessoas estão fazendo esse movimento nacionalista que desemboca no protecionismo econômico? A resposta está ligada ao longo processo de globalização que fundamentou a ação política-econômica no mundo nos últimos 20 anos, defendendo uma ideia de que a abertura de mercados traz mais benefícios e crescimento que problemas.
Mas, o que a globalização trouxe de regalo ao mundo foi o rompimento da percepção de estado independente. As empresas globais não se importam com o que acontece localmente e desejam o livre transito de mercadorias e insumos (pessoas) visando um mercado cada vez maior para seus produtos.
Como consequência, produtos, populações e culturas invadem os estados antes monolíticos, tornando-os um território-mercado, sujeito ao modo de produção imposto. E está tudo bem, até que uma violenta crise cíclica apareça e as pessoas fiquem incomodadas tendo que disputar empregos com trabalhadores que estão do outro lado do planeta e que nem sentaram ao seu lado na sala de espera da entrevista. Sentem-se incomodadas com discursos religiosos e comportamentos que contrariam sua doutrina teológica e passam a não achar mais interessante o diferente, a troca de culturas e tudo aquilo que é valorizado no processo de globalização. É como se a viagem de lazer de fim de ano ficasse permanentemente dentro da sala e, de repente, as pessoas não querem mais isso, querem de volta a velha ordem mundial.
E o que esse movimento nacional-protecionista, que pretende o fechamento de mercados e fronteiras espera enfrentar? Seu Cérbero: o cão de três cabeças que guarda a porta do submundo de Hades e que foi criado pela grandes corporações da velha ordem sob a égide do pensamento monetarista e do laissez-faire da escola de Chicago, pois necessitavam de um controle rígido da inflação para preservar o valor de seus ativos, de pouca ou nenhuma regulação para gerir os seus negócios e de domínio sobre outras nações para derrubar suas fronteiras. E quais são as cabeças de Cérbero?
A primeira cabeça de Cérbero é o poder econômico globalizado: 147 grupos econômicos detém mais de 40% da riqueza mundial¹. Estes grupos não tem interesse em entregar mais valor a determinado estado em detrimento de seus resultados. Necessitam de transito livre para seus investimentos (produtivos ou não).
A segunda cabeça é a própria. Quem criou a globalização foi a própria Velha Ordem Mundial. Não se está enfrentando uma nação mais poderosa, o enfrentamento é contra si próprio, contra um sistema dominante, em seu próprio território, contra sua própria gente e com poderes que influenciam instâncias políticas e sociais.
E a terceira cabeça, aquela que completa a semiose é a revolução da informação com sua característica disruptiva, capaz de determinar o mote dos negócios , que reforça o conceito de transnacionalidade e onipresença de produtos e serviços, precificados por meios heterodoxos e complexos e criando um mercado gigantesco de informação. Nunca antes na história seus dados pessoais valeram tanto e, se valem tanto é porque o mundo dos negócios o usam para algo. O que nos faz refletir: Usam para que? Para influenciá-lo a realizar algo, talvez comprar um produto ou serviço, talvez escolher determinado candidato, talvez ser contra ou a favor de algo!
Portanto, para as nações que desejam um freio no processo de globalização, impondo certa regulação aos mercados, proteger seus empregos (não se trata mais dos negócios, estes são globais) e sua cultura, deveram fortalecer seus processos de representação democrática para evitar a influência econômica das empresas apátridas, promover um revisionismo na Escola de Chicago e seu fundamentalismo econômico positivista e, por último, incorporar o pensamento disruptivo da revolução informação no modelo de um novo estado que permita tudo, mas que seja intransigente na proteção dos seus valores.
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